sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Céu e terra

Aquele homem bateu a carteira daquela moça, que bateu o carro naquele poste, que caiu em cima daquele muro, que cercava a vida daquela gente, que corria atrás de ser tão valente, que não era tão simples de ser alcançada, que a moça insegura se sente cansada, que, porém, toda vida não soube que pode, que bastante poder é maior que a ode, que em prosaica bobagem se faz poesia, que de passo em compasso se faz uma vida, que de história em história se faz outro livro, que de livro em livro se faz uma pátria. 

Aquela pátria que bateu a carteira daquele povo, que de dor em dor se oriundou outra, que com remédio ruim é que o corpo melhora, que melhoras devera é só via polícia, que pela segurança espanca a violência, que violento mesmo é quem bate a carteira, que tudo aquilo era o povo brasileiro, que era salvo pelos homens vindos de Brasília, que Brasília era nome de carro que não presta e que político bom era aquele que morre.

Aquele político que bateu a carteira daquele povo, bateu com a cara na porta, foi mal recebido no céu dos credores, foi decapitado pela mão revoltada, num sonho bonito de vã liberdade, lucrando com ingressos das cenas Hollywoodianas (Fifanianas), bateu com o dedo na quina e investiu trocados, passou ileso e a Fifa faz festa, o povo faz festa bebendo o que pode. A bola roda, o mundo gira. E o homem que bateu a carteira do povo é aclamado em carro aberto, procissão moderna. Velas e mais velas e bandeiras. Gloriosos, vitoriosos. Tudo é esquecido. O Brasil é campeão. 

Aquele homem que bateu a carteira daquela moça era novato. Nem com todo o prejuízo do mundo, causou problema algum. Vilão bom não passa nas portas do inferno, o capeta não quer nem ver perto. Palmas ao governo, vivas à população! O povo aplaude, a moça chora. E com a carteira vazia, a flor que não nasce, esmaga a esperança. Não era nem perto do mármore de esperança. Que dela saia um pouco de bile inorgânica da subjetividade da flor. Pessoas espertas tentam roubar o que não lhes pertence. Ladrões de bem, profissionais.

Rezem. Peçam um pouco mais. Ser bom é mesmo um conceito torto criado por tolos, entre o céu e a terra.






sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Pitoresco

Vou para um hospício quando eu estiver bem
Tem quem não me queira bem?
Rima é uma arma usada, rima forte, rima viva
As palavras tem que ter peso, força, alma
Palavra jogada na lata e misturada não é nada
Busque a musicalidade, abuse da complexidade
Crie seu novo reino, meio sem querendo
Repita jargão não, jargão não se imita, tenha dó!
Se repara que imita, o que é pior, até de onde fala, não me irrite
Tenha pena da pena, ela merece respeito
Use a pancada de cada palavra, no conjunto
Uma sem a outra colocadas amontoadas dentro de uma oração não garantem a salvação
Vá buscar um novo jeito, o centro, o repique certo
A virada, o refrão correto, a luta muda
A rima é rica por si. A palavra é forte por si. Poeminha é tudo isso aí.
Poesia, meu caro, não se iluda!

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Uno

Sou uno. Vivo a filosofia dos sonolentos e sou a favor da Revolução Ociosística. Sou contra o sedentarismo mas odeio imposições. Odeio depender que um monte de gente tosca entenda e goste do que escrevo para que isso se torne uma coisa boa. Sou contra todo tipo de preconceitos, exceto os meus. Sou a favor da cultura de massa, do monopólio e da colonização Euro-asia-norteamerica-oceno-índica-subsariana. Gosto de escrever em torno do meu umbigo, odeio livros que não me chamem a atenção, tenho gosto duvidoso, sou muito diferente do que faço. Gosto de falar das minhas raízes, mesmo sempre fugindo delas. Gosto de história triste, gosto de complexidades, gosto de pornografia. Não gosto nem de ler e nem de assistir nada que seja angustiante, mas gosto de (e tento) chocar. Gosto de música alta, não gosto de ser um mal músico. Sou bipolar e não gosto disso. Gosto do gosto de gostar e desgostar. Gasto horas com nada e gosto e condeno isso. Gosto de pobre e gosto de rico, mas não gosto de pobre metido a pobrezinho e nem de rico filho da puta. Gosto que me chamem de arrogante, gosto de ser humilde, não gosto de me fingir de menos competente para agradar medíocres. Gosto do que estudo, odeio lista de presença e reprovação por falta. Gosto das minhas inteligências, de algumas habilidades. Gosto de aprender novos esportes, gosto de praticá-los sempre, mas odeio ser mediano no futebol. Odeio, aliás, ser mediano.
Gosto muito de aparecer, de atenção, mas odeio bajulação e idolatria. Gosto do palco, de falar alto. Odeio ficar sentado esperando o tempo fechar feridas. Gosto de escrever rápido, odeio reler e corrigir. Gosto de animais mas odeio cuidar deles. Aliás, odeio cuidar por muito tempo. Gosto de educar, dar lições de moral, rebaixar em nome de um crescimento forçado. Odeio que pisem na minha cabeça. Adoro ajudar os outros. Não tenho medo dos que tentam destruir meus sonhos. Odeio que me contradigam, retruquem-me, mas adoro discussões. Odeio que digam que estou errado quando estou certo e quando estou errado. Gosto de piadas ruins e odeio gato preto gritando com voz de criança enquanto transa. Odeio transa de gatos!
Odeio ser supersticioso e hipocondríaco, mas gosto mesmo de escrever em meio às minhas crises. Odeio ter medo, odeio a morte, odeio fatalidades, acidentes. Gosto de ser melancólico, gosto de tristeza e de solidão. Odeio, no entanto, ficar sozinho. 
Odeio ser ansioso e não ter um médico que me diz que tô bem. Gosto e preciso entender minhas sensações, dores. Gosto de ler e assistir filmes, mas na maioria das vezes não tenho muito saco pra isso. Gosto de internet, videogame, esportes. Odeio minha falta de controle emocional. 
Gosto muito da minha namorada, odeio quando ela se rebaixa. Odeio TPM e gosto muito dos efeitos do chocolate nas mulheres. Gosto de doce, de comer. Odeio não ter dinheiro para coisas quaisquer e odeio que me paguem por coisas que quero na falta dele. Gosto, no entanto, quando fazem-no e posso pagar. Odeio meus estados de pobreza. 
Gosto de tecnologia, consumismo, roupas caras. Odeio me sentir desarrumado, a não ser que pareça estilo. Gosto de sofrer pra conseguir as coisas, mas odeio o processo enquanto não as consigo. Odeio ter medo, odeio ter medo, odeio ter medo. Odeio ainda mais, ser meu próprio inimigo. Odeio trabalhar, mas gosto do meu trabalho. Gosto de arte mas odeio fingir ser um artista o tempo todo. Odeio bichogrilisse exagerada e odeio peruísse exagerada. Odeio exageros.
Gosto de beber, tenho medo de drogas (e gosto desse medo) e gosto um pouco de festas. Adoro meus personagens. Gosto das minhas máscaras. Adoro ficar com sono e poder dormir. Odeio ter que escrever para me manter acordado. Vivo a filosofia dos sonolentos em busca da minha revolução. Da minha nova vida. Do meu jeito único de ser. Uno. 

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Mais sobre minha peça, "A Árvore Seca"




Realmente, foi emocionante ver meu nome perto desses nomes tão incríveis. É uma felicidade imensa.
Eu vi essa história dentro dos ônibus, no caderno vermelho, nas minhas histórias de criança, espectador do que escrevia. Hoje foi parar nas páginas de jornais, revistas, em sites... Quero tanto isso pra sempre!
Mas agora, com algo novo.
Em breve!

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Volto a escrever aqui em breve. O blog não acabou. Nem minhas ideias. Só espero que consiga voltar a escrever coisas que gosto e que me deem muita vontade de publicar. Logo algo de bom vai acontecer.

domingo, 31 de julho de 2011

A menina, sozinha

A noite, sozinha. A menina que gostava de estrelas e cigarros. Cigarras e bebedeiras. A menina descontente e dada, sozinha, a menina. A menina que vende o corpo e amores. Numa sala sem móveis, muita gente, sozinha. Num canto, falada, sorrindo. Tinha seios pequenos de criança, mas não era. Falo de menina mulher, moça vivida. Vívida. Lívida. Sofrida desde o momento em que nasceu, por piras próprias. Descontente com a vida, a menina chora sozinha quando a dor aumenta. Sozinha. Pobrezinha. Em uma conversa rápida um homem a leva a um canto. Mal ele sabe. Ah... histórias. Para que contá-las? Uma conquista rápida faz bem a qualquer homem. Cara bonito, vida fácil. Uma conversa franca. "Você é a amiga do João?" que era o dono da festa. Homens ricos tem amigas influentes sexualmente. Se era, R$ 300,00 daria alguns minutos de prazer. E a menina, sozinha. Vai e volta com cara de nojo, amigo bonito e bruto, cara escroto.
Conversa franca. "Quem é você?" era outro que perguntava. A menina olhava para um olho claro e pensava. Mas não importa pensamento de puta, não importa. Moça com cara de rica, nascida a vinho e pão de ló, cachaça na mamadeira e gotas de um padrasto escroto. Puro clichê da vida. Mas meia hora e a festa ia dando lucro e a menina sem rugas, maquiagem impecável. Malhava para não ter que ficar em casa vendo nada. Tinha aula no dia seguinte. Pagava as contas de casa. Da sua casa linda, sem móveis. João, amigo franco que morava perto, fazia festas e convidava amigos ricos e amigas putas.
"Você já foi à igreja?". Seus olhos murcharam, perdeu o tesão. Igreja é pergunta que se faça a puta? Claro que foi. Foi ver se tinha público. E tinha! Oh, se tinha. Público cativo, contra castidade, pela perversão. Gosta dessas coisas, a menina. De boba não tem nada. "Sou evangélico e tenho medo de um castigo divino", diz o chato. Não aguentou cinco minutos e ficou no canto com cara de bobo, rezando por dentro, se sentindo um nojento escroto. Aquela merdinha nem era traição e a puta, a tal menina sozinha se ria por dentro, pensando em segredo das bobagens que passavam na cabeça do babaca. Não sabiam dividir aquela fodinha rápida, mas pensamento de puta não importa.
Vai embora, a menina, sozinha. Meteu mais que qualquer outra naquela noite. De sozinha não tem nada. Quase R$ 1,000,00 no bolso, pouco se fudendo para os que olham atravessado. Amanhã tem festa no shopping. Bêbada, trôpega, sai sorrindo. Vai seguir uma carreira eterna e dormir. Pobre menina sozinha. Indefesa. Coitada.
Sua mãe ora por ela, de algum lugar. O homem evangélico chora enquanto ora por ela, em algum lugar da cama do lado da esposa. O rapaz que nunca saberá quem é a moça ora por ela em algum canto, sente dó da puta. O boyzinho escroto espalha aos amigos como foi o fodão com a menina, depois volta e se sente nojento. A menina, sozinha, sorri.
Nunca fora a igreja. Mas pelas muitas orações de culpa que recebe, Deus com certeza olha por ela. Para a menina, sozinha.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Palpitações lexicais

Ele abriu o Google atrás de um remédio que respondeu você quis dizer algo. Não era aquilo. Ele havia dito aquilo que ele queria mesmo, mas se nem mesmo o Google ajuda, tá difícil pra solucionar. Ligou pra quem pode que nem mesmo quem podia atendeu o celular. Desligou meio escabruncado desesperado e tentava chorar. Nem lágrima, larga de frescura e vê logo se si cura. Segura a onda, meu rapaz, vida longa ao herdeiro da dor. Quase morte e hipocondria não se encontra um só dia remédio não. Solução é ir no médico e ouvir a mesma coisa e fingir que tá tudo bem. Volta e tenta pegar no sono, e o sono é rápido que de tão rápido ele não vem. Foge feito coelho correndo, coelhinho com medo, meu sono. Meu? Nem notei de tanto desespero que o ele sou eu.  Eu vou atrás e me canso e nem cadeira de balanço me derruba e amanhã é olho e pálpebra e tudo que é de ver, cabisbaixo, olhisbaixo, e palavra que foge depois de noite mal dormida. O diabo da ansiedade é de uma maldade desinibida, desavergonhada, salafrária, mal-comida. Filha do cabrunco.
E eu que me confundo e travo e pesquiso de novo e o diabo do Google me diz que to grávido. Mas isso já foi melhor, volto e tento medir a maior distância entre as palavras e com deselegância mando a merda por dizer de novo que não sei o que dizer. Escrevo outra e descubro, finalmente, Síndrome de ansiedade, frescurite no cú, e dorme pra ver se passa igual fome de pobre. Não chora que tá tendo oportunidade (e mudaram as pessoas de novo) (e pluralizei quando eu era um só) (mas se sou eu e ele então sou dois) nessa vida tão difícil. Mas queria ofício de escritor, mãe. Queria ofício de professor, queria tá formado. Formado não só na faculdade. Gente formada mesmo. Psicossomaticamente desenvolvida. Despalavrizei-me. Não corrigirei nada dessas minhas inverdades. Sessão de descarrego, on-line.
Mas ainda tem mais, pois o HD tá cheio de vírus. Scaneia, scaneia... Busca, prende, mata. Aquilo que me mata. Eram mais de mil buscas e mil palavras e mil atividades e atitudes. A cabeça funcionando frenética, desacreditada. Quando pego pra escrever só andam saindo esses burburinhos de nada, coisa de gente malvivida. As coisas andam amadurecendo demais. Sou capaz de dizer que tem mais pra viver, muito mais. E tem. Ah se tem. Que me aperte a garganta menos forte, só isso. Dá um tempo pra eu respirar. Só isso que lhe peço. Ando calmo. Correndo desesperado. Atrás de algo que nem sei mais o que é. Não sei onde começam meus sonhos e termina meu pé. Meus dias andam mais longos do que eu queria e mais curtos do que eu precisava. Paciência. Acho que são resquícios das temáticas.
Para terminar uma frase mais genial: Relaxa! Com o tempo você percebe que o estranho era você não estar surtando. Sem mais, meritíssimo!

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Sobre temáticas

Faz tempo que não escrevo para não impressionar. Não que realmente impressione, mas estou em um processo de enriquecer meus textos, os novos, com o que ando vendo de mais grandioso na literatura. Um processo muito interessante. Venho sentindo uma vontade imensa de encarar uma história maior. Acho que, mais do que nunca, vai chegando o momento em que será necessário para mim encarar uma história grandiosa. O problema são as temáticas.
Fico com medo de errar a mão, o tom. Antes acreditava na importância de uma grande história. Não que não seja importante, mas hoje percebo que uma grande obra não depende disso. Grandes histórias servem para vender. Mas será que eu quero "SÓ" vender?
Eu queria conseguir criar uma obra prima que fosse sucesso de crítica (literária séria) e público. Que ambos, público médio e elite intelectual "butada" (ou seja, que foi "butada" por outros "intelectuais" nesse patamar) pudessem me ler com o mesmo prazer. Para isso existe uma fórmula, que venho tentando desenvolver há tempos:

S = Lm ( x---> r) + Li (x+y ---> 'r) ---> r+r'

O termo "S" seria o sucesso. "Lm" é o termo que indica o livro médio, que seria uma história "x" que leva a um entendimento "r". "Li", portanto, seria o termo para "Livro intelectualizado", que seriam a soma de "x", uma história interessante recheada de aventuras e coisas que agradassem esse tal público médio e "y", que indicaria a presença do interdiscurso, do implícito, do genial, da palavra certa, da sonoridade, daquilo tudo que é bem quisto pelos críticos, tudo isso nos levando a um termo " 'r ", um "não r", um negação a história encontrada pelos tais leitores médios. Tudo isso sendo levado a soma de "r" mais "não r". Um resultado que, afinal de contas, agradaria a ambos os públicos.
Por se tratar de uma teoria inicial, ainda não tenho total certeza que a fórmula está correta. E graças a internet essa fórmula poderá ser reelaborada e crescerá até sua perfeição.
Entende agora o porque de eu não mais escrever? A Universidade, ao mesmo tempo que me ensina, me deixa louco!
Mas o grande problema, meu caro, são as temáticas.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Refluxo

Aliás, era sábado. Não, não comparo os dias, são do jeito que bem entenderem. Eram ótimos os sons de balões estourando. Festa tem que ser de sábado. De carro. Vibrantes, cores vivas voavam, os estouros eram ouvidos de longe. Era convidado de honra da minha festa surpresa. Dentro de um carro, chegando. Todos se transformaram em animais. 
O passeio para o zoológico, tão comum, tão que não. Zoom na câmera, zoom... Leões e girafas, paralelepípedos e suor e fome. Cabe na descrição a visão. Sem tato, cerca de trinta metros ou mais distanciavam os animais dos leõesratospirarucussaposcobras, tanto medo. Aranhas, mais de cem peludas,  corriam e se transformavam. Giganteávam-se. Demoníacas criaturas que corriam em nossa direção. Virei e vi um robô. Grande, vermelho, com luzes coloridas e ele pisoteu as aranhas aí eu atrás do armário estava escondido aí eu saí pra ver. Estava sentado mais vinham pizzas. Mas eles não entregam pizzas em Marte? As pessoas em volta falando e eu fazendo sexo com uma boneca que nunca vi na vida. Tomei um tiro. Tirei a bala e o blábláblá. Aniversário surpresa e todos comemoravam o fluxo primeiro. Corri atrás da bola aí eu, logo eu, fiz, vejam só, gol de placa. Era campeonato televisionado aí minha mãe ligou e disse parabéns. Aí achei que era ameaça, porque eu estava de castigo aí minha mãe brigou.
Era meu aniversário e passeando no shopping eu estava pelado e aí eu senti vergonha e me escondi atrás de um fliperama e era casamento da minha prima que eu nunca vi na vida e eu tinha 9 anos e pedia pra jogar e ninguém deixava e fui jogado na piscina só que eu não sabia nadar aí um barbudo que era um tio que eu também não conhecia me tirou da piscina e aí eu entrei de colete. Tinha 7 anos. 
Brincava com a boneca da pizzaria, peguei um carro preto cheio de brinquedo e acelerei na estrada e o carro caiu caiu caiu e eu com frio na barriga assustei. Devo estar crescendo. 

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Amor "burguês"

Abandonei o balé. Até meu cigarro anda um tédio. Meu marido diz que pareço bem, mas ele mesmo anda pelas ruas a olhar outras mulheres mais novas. Minhas amigas vivem a me chamar para tomar uísque e falar besteira. Elas me enchem com putarias que não tenho mais saco pra ouvir. Abandonei a rua. Minha casa é meu país. Sou bairrista. Sou fã do meu piano de calda, da minha cozinha. Ouço Elis o dia todo e me acabo cantando sozinha quando, é claro, estou sozinha. Meus filhos hoje tem 14 e 16. Vivem na casa dos amigos correndo por aí. Queria um condomínio por ser mais seguro, está aí: tão seguro que na casa não fica ninguém. A minha segurança está garantida pelos muros da minha casa.

Abandonei a ralé. Tinha família pobre, que nem sei se viveram. Casei bem, graças a Deus. Hoje o meu palacete é um sonho, e de pobre tenho uma de extimação que lava e cozinha. Adoro ela. Me faz ver como é bom ser melhor que os outros.


Abandonei tudo e todos. Já nem ligo para as prostitutas que sei que satisfazem meu marido por quantias quaisquer. Se elas se acham espertas, não me conhecem. Vivem a dar por mixarias. Vivo bem com um homem só, que me da muito amor. Muito mesmo! Outro dia me veio com um brinco que brilhava mais que a panela que a Lourdes lava. Se não me amasse não me compraria presentes tão caros. Amor e ostentação andam lado a lado. Amo cada peça de roupa, cada sapato. Cada ato pensado, comprado.


Abandonei-me.

Só, sinto como rugas no cérebro. Não penso, nem sinto, nem nada. É por isso que hoje vou dar para o máximo de pedreiros que eu puder. Fazer coisas que nunca fiz com ele.

Só pra ver se me animo...

sexta-feira, 15 de abril de 2011

As Viagens de Gertrudes

Imagine vilarejo sem nada, abandonado por Deus - Sarava - longe das florestas e d'água, árido, seco, chão de pedra, pouca gente e bicho, onde quase nada que planta dá. Lá nasceu Gertrudes, filha de Narcisa, esposa do finado Zé Caldeira. Veio do nada pra capital, onde a vida é mais bela. Já nasceu ouvindo histórias da atriz Narcisa, sua mãe, com grandes rodas do lado de fora do Theatro Municipal. Assim, vivia sua infância pelo mundo. Foi pra tudo quanto é canto, da Groelândia à Disneilândia, dos Subsarianos aos Marcianos. Só imaginando.
O maior tesouro que tinha era uma caixa grande. Um Baú. Era de onde saíam todas as histórias. Baú com tantas histórias pra contar, com tantos lugares pra visitar, tinha mesmo é que ser trancado a sete chaves. E era assim que era. Como plantar era difícil e água contabilizada, os alimentos eram esses. Mas todo mundo morre e com Narcisa não foi diferente. Estava em cena, quando leões em meio a mata nativa angolana mordiscaram-na. Estavam com fome, assim como ela. Caiu em cena e nunca mais levantou.
E como morar com madrasta do mal não combina com carnaval, foi morar em uma tribo, lugar que chegou do nada em meio à fuga desembestada.
Cresceu em meio a Pigmeus anglosaxões em floresta na Idade Média. Lá aprendeu a caminhar sobre o mundo a passos de gigante. Passos que passam, eis que tropica em caixa grande. O tesouro. Estava perto de onde caíra o corpo de Narcisa e Gertrudes já nem se lembrava. Apagava com subjetividades e passeios. Trancado. As chaves estavam perdidas longe dali, em algum canto longínquo.
Piscou os olhos, bateu os calcanhares e chegou à antiga casa. Abriu a gaveta (agora enquanto a criança que ainda era) e pegou as sete chaves. Abriu um a um os sete cadeados.
O baú escancarado berrava para a moça que viveu entre pigmeus, pois viver entre anões era fábula de criança-mundo.
Conhecia todo canto, todo conto. Lembrava de todas as viagens com Narcisa. Menos uma:
Pano rosa com palmeiras e animais e pavões e flores, pano grande e leve, pano com pontas. Chapéu com cara de cobra que comeu elefante (imagem poética de criança-mundo). Círculo roxo, coisa de enfeite de braço de mulher-cidade, de boneca urbana. Lembrou.
Eram coisas de praia. Mulher-cidade nunca usava na rua. Roupa de praia. Moda praia. Imagem poética de mulher-cidade. 
Praia? Nunca viu o mar! Não sabia chegar a passos de gigante lá. Era tão inalcançável, tão grandiosamente desejável. Era água demais. Ela que sempre viu água nunca. Água pouca. Água implorada em copo americano.
Andou dias segurando em Sol torradreira, imagem poética que desconhece Gertrudes, os objetos do tesouro. Foram semanas. Parava em alguma casa, pedia comida como criança e andava. Chegou a pegar carona, enquanto moça, com aves e cachorros e minhocas. E chegou.
À sua frente, da moça grande que andava sobre mapas, o mar. Gigantesco, ondulento, mareoso. 
Para nós que não vemos as histórias e nem baús gritantes e nem pigmeus medievais e nem leões mordiscadores, a cena que se via era a de uma menina raquítica, com corpo de morte, pequena, da pequenês pigmeutica, 8 anos. Estirando canga velha, empoeirada, que se senta em cima, com um chapéu amarelo amarelado, que de grande cobre os olhos e um bracelete que chegava ao seu ombro. Desejo de menina-metrópole que pega o sapato da mãe. Sentada admirando o infinito mar. Mar de gente, praia de concreto, segurando um saco na mão direita, olhos vazios.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

O inusitado conto do encontro - Ato 2

Caminho. Mantenho-me distante do filosófico, foco-me nos reais. Já viu uma rua de terra? Já andou em trilha no mato? Entre prédios, casas? Gosto de caminhos. Caminhar é dar vida a eles. Somos o sangue dessas vias. Subidas, descidas. Aquele era diferente. Acho que o choque da situação tornava-o mais denso. Denso, isso mesmo. Não nego certa tensão e talvez tenha sido ela a principal responsável pela minha tomada de consciência sensitiva. Tornei-me sensível aos detalhes em volta.
Uma padaria na esquina nos tirava da agitação da avenida principal e nos levava por um caminho cheio de árvores, casas térreas, buracos e lombadas. No alto da padaria, uma locadora de vídeos e jogos. Lá estão os filmes que me assustavam e os que me divertiam. Lá estavam os cartazes e as escadas que me levavam para uma porta sempre aberta. Fiquemos lá embaixo. Do lado uma farmácia. Ou outra coisa. A rua continua, e à esquerda está um prédio onde quase moramos. Era meu sonho burguês. Tão simples. Tão. Na esquina uma árvore e uma grade verde. Como esqueci da grade verde! Passava minhas mãos por ela, como a criança ao meu lado fazia. Na esquerda, uma rua que me levava aos meus antigos amigos que não estavam mais lá. À direita, uma locadora roxa com videogames ligados em uma rua que cortava meus caminhos. Prosseguindo naquela pequena ladeira, tinha um bar e um senhor sentado embaixo de uma árvore fazendo jogo do bicho. Tinha uma fábrica, mais vendinhas e uma rua sem saída. Lá estava um grupo de moleques jogando bola. Perto dali, minha antiga casa.
- Chegamos, vamos entrar?
- Do que você está falando!? Não podemos entrar! Essa casa não é mais nossa..
- Claro que sim! Não está vendo? O muro pela metade, o portão velho. É nossa casa!
E era. Eu sabia que a casa havia sido vendida. Já havia, inclusive, passado próximo da casa depois de vendida e ela fora completamente reformada. Naquele dia estava como sempre foi. Velha, pichada, linda. Porém, não havia ninguém em casa.
- E como sempre, esqueceu a chave, tenho certeza - disse já sabendo a resposta.
E sentamos. Aquele era o caminho. Tinha que contar as novidades.
Contei sobre meus estudos. Contei sobre meu emprego. Contei um pouco das minhas viagens. Aventuras, essas coisas... Escondi as perdas. Doeram tanto que não valia contar para uma criança.
- Chegaram.
- Quem?
- Como quem? Estudou tudo isso e ficou burro. Eu saberia quem!
Eram eles. Vinham em um Passat laranja. Pai, mãe e irmã. Lindos como eu há anos não me lembrava.
Aliás, como não me lembrava? Minha irmã mãe de duas crianças que rolavam comigo jogando UNO, quando possível. Era uma pulação, uma gritaria. Mas ela, o que dizer?
Meus pais, ambos já haviam morrido. Partiram cedo demais. Não deu tempo nem de enjoar. De arrumar briga de sogra. Nada!
E em minha frente estavam eles. Duas pessoas felizes demais, com uma criança. Uma menina.
- Olá filhos!!!

(CONTINUA)

domingo, 27 de março de 2011

Vernissage "detalhes"


A minha amiga Renata Santoniero apresentará sua Vernissage "detalhes", com os detalhes do evento abaixo.







































Mais um detalhe:










































O texto desse belíssimo trabalho é meu, uma honra imensa!
Espero que gostem (tirando as abobadas "abóbodas" que criei!)

Para conhecer o trabalho dessa grande artista, clique aqui.

Aliás, estarei lá amanhã para prestigiar esse belíssimo trabalho. Mero detalhe.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

O inusitado conto do encontro - Ato 1

Você, estimado ledor encucado, já se pensou, enquanto ajuízado, em encontrar, depois de carunchoso, longevo, senil, um você quando novo? Pense: Andando pela rua, tropica em biboca de calçada, cai de cara em pé pequeno, vê sapato bonito, aparente nostalgia. Ao olhar vê rosto familiar, de ontem na feira, de álbum de família, de capa de revista... de espelho. Lembra-se que se esqueceu como foi, como era. Pois foi em exato, nem tirando ou colocando nada, que aconteceu comigo dia desses. Antecede a isso dia morno, em temperatura e temperamento. Tinha trânsito, vaga para idosos em estacionamento chinfrim. Espairecendo nos corredores de Hospital, curava doenças, contagiava-me de outras.
Ah, mas quisera eu que o acontecido fosse em outro lugar. O destino deu ares de clichê à minha verídica história. Ora, claro que poderia mudar o lugar para melhores efeitos, o que não traria nenhuma perda de sentido; manteria sua verossimilhança. Mas foi na Avenida Paulista, entre o Metrô Trianon-Masp , um orelhão e uma banca de jornais que originou-se esse conto. A criança, pasmem, andava desacompanhada. Minha mãe nunca ia deixar tamanho de ser zanzando por aí sem supervisão de gente grande. Na queda, tropeção, encontro, não há nada de simbólico, parem de procurar, caros literatos. Lá estava eu pequeno, do outro lado. Não tinha mais que oito anos. Nem perguntei. Há perguntas que não podem ser feitas, por perigo de serem respondidas. Olhei nos meus menores e melhores olhos, lá no fundo. Perguntei seu nome, pergunta tola. Como nunca fui de aturar tolices, respondi a altura. Respondeu. Aliás, pausa.
Sabes, como eu, que somos o mesmo. Se não sabia, agora sabe. Aquele era eu quando criança. Mas como no presente me figuro como adulto, idoso se preferir, chamarei ao menor de "ele". Causa-me estranheza em referir-me a mim em terceira pessoa. Mas é para não confundi-lo. Mais. Fim da pausa.
Chamou-me burro. E riu. Disse que eu mudara. Respondi que não era verdade.
- É que não é sempre que se encontra com a gente menor.
- Ficou bonito. Nunca imaginei que ficaria assim. Te imaginava gordo e feio.
- Já fui. Hoje o deleite da morte me deixou assim.
- Sempre chorão.
- Melancólico.
- Sempre metido a sabidão.
- Brilhante.
- Sempre não aceitando perder. Ficou parecido com o papai.
- Sempre fui.
- Eu não sou.
- Logo vai ver que é.
- Ele é chato.
- Você também.
E rimos. Ríamos das coisas que aprendíamos uns com os outros. Parecia que um daqueles bons espelhos estava em minha frente. Ou espelhos bons, como preferir. Parecia que olhava para um antes bem distante. Que as camadas de minha vida haviam caído e lá estava um "eu" sem as poluições e as nojentices da vida. Sabe quantas mentiras haviam nessas camadas? Quantas horas de pensamentos ruins? Quantas toneladas de inveja, de amores perdidos, de calejamentos sociais? Era quase como a luz da essência humana. Era o não social, o verdadeiro. Era o "eu" invejável.
- Isso tudo é tão lindo!
- Mudou muito. Aliás, nunca veio aqui, não é?
- Não. Você está muito esquecido.
- São os problemas.
- Eu nunca entendi por que adulto tem tanto problema.
- Nem eu.
- A gente pode conhecer alguma coisa legal?
- Ahan! Agora sou médico.
- Mas eu não to doente!
- Mas eu tenho dinheiro.
- Ficou rico?
- Perto de antes, milionário!
- Mas como foi isso? Mamãe duvida que eu possa ser até lixeiro, só porque sou gordinho!
- Te conto no caminho.

(CONTINUA)

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Fio de ouro

Fracassei. Vi nos olhos dos meus familiares. Esposa, filhos... Vi nas lágrimas. Cada gota batia surda, aos outros. Corpo humano, granizo, para mim. Sentado estava eu. Velho, vivido, bem-sucedido. Passos planejados, articulados, estratégicos, arraigantes, no alto. Tive finezas, sucessos. Não me faltou glamour. Bem nascido, não escuso, casado com mulher de bairro nobre, com casa grande no Guedala. Três filhos. Providos e brotados a fio de ouro. Estudaram no Porto. Treinavam tênis, golfe, a porra toda que quisessem. Dois pianistas e um violinista. Se o Apocalipse destruisse a Terra inteira, exceto o condomínio em que morávamos, ninguém sentiria falta de nada. Piscina? Isso tinha no meu quintal! Tô falando de coisa que não viu nem no horário nobre, quando a Globo quer impressionar. Disney? Quase uma vez por mês. Depois de velhos, Europa. Em semana de pressão na escola, saiam ora ou outra para relaxar pelas bandas da América do Sul (máximo central). Dei porra de roupa de marca. Loja de departamento para eles era o inferno. Contava histórias que haviam monstros lá dentro. Não queria rebento meu vestindo C&A. Disseram que o mais novo um dia chorou com a Vilma (a babá)  ao passar na porta. Aberração disforme, dei impressão de pior que inferno. Justo. Cartão livre. A fatura enobrecida de zeros. E reclamei? Não. Me calava ambicionando adversativisar. Dava o que queriam. A todos. 
Que pai, me diga, não tencionaria obter, de presente, ao menos respeito por tudo isso? Nutrissem-se ricos, era o bastante. Porra, não lutei tanto pra ter filho professor! Não aceito. Dei opções. As clássicas. Se não médico, engenheiro, vai ser o que? Dançarino? Escritor? Que escolhessem. Já sabiam das imposições, das regras. Discordantes, era de lá pras escolas dos faveladinhos. Paraisópolis era logo ali! Já avisava, oras. Pra entrar em qualquer curso, precisa de escola boa? Universidade boa? Hein? Investi. Esperava um retorno. Comigo foi assim, porra! 
Um chegou no ensino médio brilhante. Terminou-o com louvor. Medicina na Pinheiros. Ganhou carro. Era uma bonificação merecida. Um Mitsubish fudido, um puta carro. O muleque não parecia feliz. Questiona-se, ao certo, tanto quanto eu, como não estava feliz! Tinha tudo! Tudo! Tudo e mais! Tudo mesmo! 
Voltando dirigindo pra casa, bêbado, drogado, hoje, às 2 da manhã, morreu.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011