quarta-feira, 14 de julho de 2010

Dor

Já se sentiu desesperado? Já deixou as lágrimas caírem na boca para sentir o gosto salgado e o nojo de se deixar entregar a dor? Já se sentiu em meio a uma situação em que ela parece tão incomoda que é cômoda? Já teve vontade de ver a pessoa amada com a nova pessoa? Pois o homem que escovava os dentes por minutos intermináveis e olhos vidrados no espelho, não sabia mais ao certo o que estava fazendo ali. Algumas vezes sentia a garganta apertada, se lembrava dela. Sua imagem. Imaginava-a tendo orgasmos com um desconhecido qualquer. Imagens surgiam do nada, sentia prazer com sua dor. Saiu do banheiro, chinelo molhado grudando no piso que deixava molhado no corredor que tantas vezes ficara molhado pelos pés dela também quando, ao sair do banho iam juntos. Incontroláveis. Eram as paredes que encostavam em suas costas e o piso úmido o mesmo que ouvia seus urros meio abafados, aquelas que já tiveram outro corpo. Tantas e tantas outras coisas. Do jantar que sentado na mesa sozinho, restavam apenas os ovos mexidos cheio de bobagem da geladeira, iguais aos feitos naqueles dias. Será que ela comia ovos com ele também? Seus olhos lacrimejavam e saíam de sua boca as mesmas promessas para esse qualquer? Ele sonhava enquanto pensava nisso em poder ver mais e mascar a dor. Já que não podia mais respirar tranquilo, queria que a dor fosse cada vez maior. Queria mesmo se fechar. Ouvia a canção mais triste que podia. Sabia que ia passar. Não sabia quando e nem porque. Desenhou linhas em uma folha de papel. Rabiscou palavras soltas. Queria arrancar todos aqueles pensamentos de sua mente. Assistia a filmes pornográficos na televisão por distração. Via programas alheios. Evitava coisas sobre morte. Queria algo sobre amor. Aqueles bonitos. Daí chorava. Chorava mesmo tudo o que podia. Ela não era daquele tipo que sempre se entregava? Como era doce pensar nela se entregando como sempre fazia! O quanto prazer não sentiria. E a dor tinha um gosto cada vez mais doce. Ou amargo. Aquele do café com cigarro. Aquele de folhas fortes. Aquele de chá sem açúcar. Aquele de amor perdido. Passional. Nada pacífico. Que destrói por dentro. Pegou da mesa aquele caderno em que ela rabiscara seu nome jurando amor eterno. Pendurou na parede. E dormiu sentindo o prazer da dor. Acordaria no dia seguinte e o que faria? Ele não sabia, mas como onipresente, conto-lhe. Sofrerá mais um mês. Pensará mais um ano. Uma noite acordará e não lembrará mais dela. Irá rir um dia inteiro contando como era. Sofrerá cada dia menos, cada dia mais. Mas no final de tudo (prefiro sempre assim) será feliz. Mesmo morrendo sozinho. Mesmo digerindo dores.Ou paixões doloridas. Ou amores.