quarta-feira, 13 de abril de 2011

O inusitado conto do encontro - Ato 2

Caminho. Mantenho-me distante do filosófico, foco-me nos reais. Já viu uma rua de terra? Já andou em trilha no mato? Entre prédios, casas? Gosto de caminhos. Caminhar é dar vida a eles. Somos o sangue dessas vias. Subidas, descidas. Aquele era diferente. Acho que o choque da situação tornava-o mais denso. Denso, isso mesmo. Não nego certa tensão e talvez tenha sido ela a principal responsável pela minha tomada de consciência sensitiva. Tornei-me sensível aos detalhes em volta.
Uma padaria na esquina nos tirava da agitação da avenida principal e nos levava por um caminho cheio de árvores, casas térreas, buracos e lombadas. No alto da padaria, uma locadora de vídeos e jogos. Lá estão os filmes que me assustavam e os que me divertiam. Lá estavam os cartazes e as escadas que me levavam para uma porta sempre aberta. Fiquemos lá embaixo. Do lado uma farmácia. Ou outra coisa. A rua continua, e à esquerda está um prédio onde quase moramos. Era meu sonho burguês. Tão simples. Tão. Na esquina uma árvore e uma grade verde. Como esqueci da grade verde! Passava minhas mãos por ela, como a criança ao meu lado fazia. Na esquerda, uma rua que me levava aos meus antigos amigos que não estavam mais lá. À direita, uma locadora roxa com videogames ligados em uma rua que cortava meus caminhos. Prosseguindo naquela pequena ladeira, tinha um bar e um senhor sentado embaixo de uma árvore fazendo jogo do bicho. Tinha uma fábrica, mais vendinhas e uma rua sem saída. Lá estava um grupo de moleques jogando bola. Perto dali, minha antiga casa.
- Chegamos, vamos entrar?
- Do que você está falando!? Não podemos entrar! Essa casa não é mais nossa..
- Claro que sim! Não está vendo? O muro pela metade, o portão velho. É nossa casa!
E era. Eu sabia que a casa havia sido vendida. Já havia, inclusive, passado próximo da casa depois de vendida e ela fora completamente reformada. Naquele dia estava como sempre foi. Velha, pichada, linda. Porém, não havia ninguém em casa.
- E como sempre, esqueceu a chave, tenho certeza - disse já sabendo a resposta.
E sentamos. Aquele era o caminho. Tinha que contar as novidades.
Contei sobre meus estudos. Contei sobre meu emprego. Contei um pouco das minhas viagens. Aventuras, essas coisas... Escondi as perdas. Doeram tanto que não valia contar para uma criança.
- Chegaram.
- Quem?
- Como quem? Estudou tudo isso e ficou burro. Eu saberia quem!
Eram eles. Vinham em um Passat laranja. Pai, mãe e irmã. Lindos como eu há anos não me lembrava.
Aliás, como não me lembrava? Minha irmã mãe de duas crianças que rolavam comigo jogando UNO, quando possível. Era uma pulação, uma gritaria. Mas ela, o que dizer?
Meus pais, ambos já haviam morrido. Partiram cedo demais. Não deu tempo nem de enjoar. De arrumar briga de sogra. Nada!
E em minha frente estavam eles. Duas pessoas felizes demais, com uma criança. Uma menina.
- Olá filhos!!!

(CONTINUA)

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