quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Pobre e coitado (ou a "Santíssima Trindade Social")

Toda manhã era a mesma coisa, e nunca as coisas mudavam para aquele homem, que acordava de mal humor, decepcionado, e recebia a ligação de estar atrasado. Não importavam, para ele, esses fatos. Ele sabia o que fazer para melhorar, sabia que talvez era possível. Mas é bom do jeito que está. O ruim acostuma e costuma ser viciante. Mas era assim dia após dia. Sina de quem até acha bom viver dessas coisas. O ruim é o mundo. Ele era bom. Bom demais pra ser "Humano". Ele não lutava pois simplesmente não achara necessário em nenhum momento de sua simples vida. Mas na cultura do "Correr atrás antes que te engulam" de nosso lindo mundo (monstro lindo), ele foi devorado. Acordava sem querer acordar, olhava, pois olhos orbitavam sua cabeça, e pensava não sabia porquê. Caiu no mundo, pobre e coitado o "Pobre coitado". Daí era só sujeira. Jogava o lixo pelo vidro do ônibus e alguém lhe perguntava: "Você, por um acaso, faz isso na sua sala?". De sua boca, saía algo como um ruído: "... sim..." Para quem não tem motivo, nesse mundo, a vida é meio suja por si. E se simplesmente a vida fosse justa, a sujeira limparia sua mente, concientizando o homem moderno, pós-moderado, pré-cozido, microfabricado, fadigado de estupefações criadas por intelectos alheios. Mas ele servia pra ser servente em uma grande obra, onde todos sabiam o que queriam da vida. Ele assistia aos grandiosos sonhos alheios daqueles que aprenderam com o mundo a sonhar. Sonhavam com um monte de coisa cara. Gastariam a vida inteira trabalhando sem gastar um tostão em banalidades mais importantes para metades dos sonhos incabíveis serem realizados. Concebia em sua mente algo menor. Bem menos. Quase nada. Aliás, em sua mente era percebido, além do nada, nada. A única coisa que queria era ser conhecedor das coisas. Mas isso era caro. Estudar, viver, morar, comer, juntar, pra ter, tentar, viver. ("Viver" aparece duas vezes, sei. Mas o intuito é diferente; releia e perceba, sinta, e pare de me corrigir mentalmente!). 

Sabia, quando acordava, o que faria. Se extressava, se divertia. Era um ser puramente idêntico ao estereótipo criado por você, durante todos os anos em que viveu. Duramente democrático, nosso mundo dita de forma ditatorial nosso "Status quo". O dele era "Marginal". Marginal da sociedade, por ser pobre. Marginal da sua própria comunidade, por não ser "Marginal". Só não era marginal da fé. Frequentava a igreja que ficava próxima a sua morada, mas sonhava morar com os anjos. Pedia, frequentemente, para morrer, de forma não dolorosa, ou insuportável. Desejava ao menos uma vez sentir o gosto da atenção que se desdobraria aquele dia. Os rostos em sua volta, a sua face sangrenta, o seu desenho no chão. Ele se tornaria imortal, até que o giz saísse do asfalto. Sua obra deixada seria pós-modernista, com tendências dadaístas, como nossa ilógica "dadadização" da vida, do viver, que fez o homem esquecer de querer essa vida. 

Acordou sem pressa. Andou em direção do lixo. Sentou. Era feriado, ele não iria trabalhar. Levantou-se. Foi até a igreja, sujo, sem pressa. Era próxima a sua casa. (igrejas investem pesado onde mas gente sofre desesperada... Dar esperanças dá lucro!) 

Naquela tarde ouviu o que tinha de ouvir. Lamentaram o que tinham de lamentar. E te contaram sobre a Bíblia. Ele já a conhecia, mas acontece que dessa vez ouviu algo divertido. Dessa vez se sentia melhor. Por 15 minutos. Depois foi ver TV. 

Toda manhã era a mesma coisa, e nunca as coisas mudavam para aquele homem. Mas ele se sentia bem assim. Por pura e simples falta de aprensentarem a ele algo novo, melhor. Quem sabe um livro novo? Ou amigos inteligentes? Ou como fazer a sorte? Mas hoje não. Ao sair confundiram-no com alguém procurado. Seu sonho foi realizado. Seu sorriso era visível...

Ninguém sabe porque foi feliz aquele dia na igreja, muito menos quem se confundiu. Mas às vezes parece que alguém lá em cima anda consertando alguns erros. Ele era um acerto. Na hora certa. No lugar errado. Foi parar na estatística da ponta de baixo da "Santíssima Trindade Social".

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