Viu na ladeira o menino farroupilho sentado em madeira velha. Rodas girando. Alta velocidade. Corpo e complemento eram menino e pedaço de pau. Se para a direita o cérebro movia os ossos, para lá iam os emadeirados. Viu e gostou, sorriu e pensou que talvez mais velocidade faria bem para ele também. Imaginou o tanto de coisa que faria, o tanto de lugares que poderia estar em pouco tempo, as coisas que veria. Ir ao Japão ou a China, hein? Mudar de ares a todo tempo, viajar, ver o pai que mora longe, ir na padaria comprar pão. Era ou não uma tremenda solução? E os dias que chegava aquela tia chata, poder fugir sem ser visto, correr o máximo que podia. Ia ser uma delícia ter o vento batendo forte na cara. Ia compor seu espírito de coisas boas, de energia, velocidade. A adrenalina ia lhe fazer bem.
Claro, caro leitor atencioso e detalhista, que ele não tinha consciência desses acontecimentos, que narro como narrador "heterodiegético colegiado" que lê na essência humana o que um corpo sente ao sentir tamanhas sensações benéficas ao bem estar. Claro que percebeu meu tom retórico rebuscado rente ao rito da criação literária. E também óbvio é o fato de ter compreendido no fundo de sua alma que falo de alguém que ainda não disse, mas sabe quem é, mas não minto em tal afirmação e era exatamente aquilo que sentia, como já antes afirmei, sem saber. Aliás, ainda não te contei, como vistes, de quem falo e ora, não padece levar o dia todo pensando e repensando, retomando e tramando as ideias, para notar que se trata de uma criança. Quem a não ser ela desabrocharia em sonhos tão velozes de maneira tão ímpar? Quem seria tão ingênua a ter de desejo uma tábua e rodas de rolimã? Não falei de carro importado, de avião. Sabe disso. Falei de pau velho, madeira podre.
Passada a intromissão lírica do meu eu, retomo e conto que andando pela rua, o menino e o irmão estavam. Quando de súbito encontrou. Olhou ao irmão que sem entender retribuiu com um olhar confuso. Abaixou e encostou no objeto. Nos seus muitos 4 anos de vida, nunca havia pensado em realizar tamanho sonho. Era perfeito. Não sabia ele que o dito cujo outrora fôra uma caixa de fruta, daquelas que se vende uva e que agora estava aos pedaços. Mas era o seu passaporte para o mundo. A possibilidade de conhecer todas as coisas. Pegou a velha caixa. O irmão soltou um "Solta isso", que efeito nenhum surtiu. Desistiu e sorriu. Foram pulando felizes. Na esquina a mãe olhava com olhar vívido. Os olhos do garoto brilhavam. A mãe parecia confusa. Na cabeça do menino a mãe já gritava de felicidade. Era o seu momento. Sua conquista. Corria pulando, como em conto de fadas. Chegando na esquina, um sorriso na face. A mãe o olhou. E daquela distância gritou a todo o pulmão, para quem quisesse ouvir: " Larga esse lixo agora, seu capeta!"
Passei por aqui gostei e fiquei
ResponderExcluirsigo-te ...
Bjs e sorrisos!
O menino la de cima da rua passa lotado com seu carrinho de rolimã envenenado. A fluidez de espiritualidade infantil precisa invadir os corações dos adultinhos! Sem isso só adulterioridades...
ResponderExcluirOlá Sr. Alexandre Sansão, ou como diria a alguns anos atrás... Eaí Xande?
ResponderExcluirFico muito feliz de ter ter encontrado no cyberspaço, já que no mundo off-line nossos caminhos, em tese, se distanciaram. Digo em tese, pois fiquei muito feliz de saber que você está estudando em São Carlos. Primeiro porque acredito no poder transformador da Universidade Pública, obviamente, que só para os que se deixam transformar.
Segundo, você estuda algo que me é muito familiar, não que eu tenha feito Letras, e sim Hitória. Mas minha namorada é formada em Letras/francês aqui pela UNESP.
É interessante perceber como mesmo distantes, os caminhos continuam próximos... E se nos encotrássemos hoje teríamos muito assunto um com o outro, talvez, mais até do que nos idos de 2002.
Velho, parabéns pelo Blog depois de tanto tempo o descobri, mas isso é que é o mais legar do cyberspaco...
Até.
Wellington